“Vamos! Pare de tentar me atingir e me atinja!”
— Morpheus
Quando eu descobri e entendi em nível muito profundo esse conceito, minha vida mudou drasticamente. Se eu fosse dar dicas de como ser mais eficiente (como sempre faço quando falo sobre aprendizado), um dos primeiros tópicos a discutir é esse fenômeno virtualmente desconhecido fora do meio acadêmico.
O universo social
O impacto do grupo social é sempre subestimado. Por exemplo, só há pouco tempo virou lugar comum o conhecimento de que somos a média das cinco pessoas com as quais mais convivemos.
O que não é levado com frequência em consideração é o fato de nosso cérebro ter evoluído sob (e, em parte, por causa de) uma pressão social extrema. Isso nos impactou de maneiras que raramente estamos cientes.
A necessidade de sinalizar é uma delas.
Sinalizar, como a palavra sugere, é dar alguma forma de sinal que você está realizando determinada atividade. Por exemplo, um adolescente pode passar a tarde inteira na internet, navegando a esmo e se distraindo nas redes sociais, mas quando os pais passam pelo corredor para checar seu quarto, ele fecha tudo e abre os livros. Desse modo, sinaliza para os pais que está estudando sem realmente fazê-lo.
Para viver numa tribo, você precisava ser bem visto pelos outros. No ambiente em que o cérebro se desenvolveu, ser excluído da tribo indicava estar sozinho na savana, ou seja, morte. Por isso, há todo tipo de mecanismo consciente e inconsciente que nos faz agir de certos modos a parecer que temos certas características que nossos amigos ancestrais apreciavam, mesmo que não as tenhamos.
Se o que importa para sua sobrevivência é que seus amigos da tribo vejam que você possui os indicadores certos (pareça ser confiável, saudável, etc.), você não tem incentivo para realmente ser aquelas coisas, apenas para parecer.
Eu li em algum lugar recentemente (não lembro onde, argh) que se você quer entender o comportamento de alguém, observe o que ele está sinalizando, o que ele está dando a entender. Não o que o comportamento significa, mas o que ele aparenta.
A diferença entre fazer e aparentar
Um ser humano não faz isso porque ele é uma pessoa má e gosta de enganar os outros. Na maior parte dos casos é um processo inconsciente e independente de moral. Não é raro que ele se envolva em atividades que engane a si mesmo (autossinalização).
Todavia, querendo ou não, surgiu um abismo enorme entre agir para que uma ação seja concluída versus agir para parecer estar trabalhando em uma ação.
É a diferença entre fazer e parecer estar fazendo. Em Os 7 Pilares do Aprendizado, eu digo:
O modo como isso afeta nossas vidas é que normalmente engajamos em atividades que sinalizam características desejadas, que nos fazem parecer fazer algo, sem ser necessariamente o melhor caminho para alcançar o objetivo. No fundo, é a necessidade de nosso cérebro social em busca de validação externa. Esse fenômeno pode assumir o formato de autossinalização, quando, inconscientemente, sinalizamos para nós mesmos alguma característica desejada, sem persegui-la de verdade.
Para o aprendizado, estar à disposição desse problema é a diferença entre quem aprende (porque vai realmente atrás daquilo) e quem se lamenta e dá desculpas.
No caso de escolas e professores, ocorre o que é conhecido como autossinalização: sinalizamos para nós mesmos que estamos aprendendo e, por isso, terminamos por não aprender (já que apenas o sinal é suficiente para satisfazer a parte de nosso cérebro que demanda por resultados). Nós nos agarramos à ideia de que vamos aprender porque estamos tendo aula, muito embora não tenhamos julgado se isso é verdade, simplesmente porque é mais cômodo achar que estamos aprendendo.
O mesmo conceito se aplica a uma grande parcela das pessoas que compram produtos verdes para “agirem de forma ambientalmente consciente”, enquanto jogam óleo de cozinha no ralo.
Esse estudo realizado por Mazar e Zhong (2009) traz um caso interessante de autossinalização. Eles mostraram que pessoas que compram produtos “verdes” (ambientalmente saudáveis) são mais propensas a trapacear e roubar depois da compra, o que supostamente ocorre porque elas já fizeram a “boa ação moral” do dia.
Para religião, o efeito é o mesmo.
Richard Beck, um teologista experimental, encontrou um fenômeno similar entre os religiosos: eles são menos propensos a fazerem boas ações depois de irem a igreja, por exemplo, pelo mesmo motivo.
Um grande obstáculo, talvez o maior
É por isso que falo que o problema da sinalização e especialmente da autossinalização (que costuma ser inconsciente) é seu maior inimigo para o sucesso.
Imagina numa guerra, o equivalente seria um soldado de seu batalhão toda noite trocar as balas normais por balas de festim. Não importa que arma você escolha (ou “estratégia/caminho” para o sucesso você siga), nunca vai funcionar porque não foi designada para atingir o inimigo (levar você de fato a suceder).
A maior prioridade é se livrar da sinalização, antes mesmo de tentar descobrir como obter sucesso na vida. Assim como na guerra, a prioridade seria se livrar daquele soldado, antes mesmo de testar qual arma é a mais eficiente.
O foco em fazer acontecer
Em qualquer atividade, sempre assuma que o jeito que as coisas são feitas é ineficiente. Busque alternativas antes de engajar no modo óbvio de executar a atividade.
Em qualquer atividade em que você se engajar, o primeiro passo é entender os requerimentos. O segundo passo é raciocinar, por conta própria, qual é a melhor maneira de fazer aquilo.
Só depois disso você compara com o modo que a atividade é feita hoje. Uma vez que o incentivo geral é parecer estar fazendo ao invés de realmente fazer, é provável que os métodos atuais não tenham eficiência.
Isso não quer dizer que você vai sair por aí andando de cabeça para baixo, plantando bananeira. Ser contrário ao que se é estabelecido sem motivo é idiotice. Contudo, não deve haver problema em tentar coisas diferentes, uma vez que você tenha descoberto razões válidas para tanto.
Por mais que pareça “estranho” para as pessoas que você esteja estudando sem ir à faculdade ou ao curso, não tem problema se você verificou que aprende melhor estudando com muitos livros em bibliotecas.
Ou se você não quer “gastar aquela sexta-feira fazendo voluntariado na ONG perto do trabalho” se você calculou ser mais eficiente para a ONG que você passe o dia trabalhando e doe o apurado no final do dia.
Menos aparência, mais ação.
Pergunte-se: “qual é a melhor maneira de fazer isso?” e vá atrás da resposta. A verdadeira resposta.
“Não! Tentar não. Fazer ou não fazer. Não há tentar.”
—Yoda
Excelente texto Paulo. Acredito que a simples consciência dessa realidade (“necessidade” de sinalização e auto-sinalização) já trás grandes benefícios e ajuda a, no mínimo, pararmos de justificar tanto o fracasso. Se observarmos bem, muitas vezes convivemos com pessoas que, antes de fracassarem, já usam grande parte de sua energia para tentar elaborar uma justificativa para caso realmente fracassem.
Vejo isso também na supervalorização do esforço e na desvalorização do resultado em si. Na escola, principalmente, muitas vezes se vê: tirei nota ruim, mas ao menos estudei e me esforcei. Ora, seu objetivo era o esforço pelo esforço ou o esforço para atingir algum resultado (a nota boa)? Mais importante era trabalhar da melhor e mais eficiente forma possível para atingir ao resultado que você definiu ou mais importante era mostrar para os outros (e para si mesmo) que você, ao menos, se esforçou e se dedicou? Horas e horas de estudo ineficiente em que o aluno simplesmente “lê” e “relê” sem entender patavinas são desperdiçadas com o auto-engano de que o que vale é se esforçar.
Já estou me alongando, mas isso me faz pensar, também, em quantas vezes desistimos antes da hora por, por algum motivo, nossos pares não gostarem das nossas novas empreitadas. Mais importante que se fazer o que se acredita, é ser aceito. É preferível ser aceito como parte do grupo que pensa que o fracasso é normal que tentar algo mais ousado. Nesse ponto, a internet é lindja, podemos fazer parte de grupos que, normalmente, não faríamos. Também é legal pensar nos vários desvios desnecessários e das várias mudança de foco quando fazemos da percepção do outro, nossa “juíza” e isso trás a lembrança daquela historinha do burro, do velho e do menino (que você deve conhecer).
Enfim, mais uma vez, muito legal a postagem.
É bem por aí, devo abordar esse ponto da identidade em um próximo post. Esses dois fatores sozinhos podem causar um impacto enorme na vida de qualquer pessoa.