O nível de endividamento do brasileiro é alto e atingiu recordes históricos em 2014. Ele, que é a proporção entre as dívidas e as rendas, gira em torno de 45%. Isso significa que metade do que o brasileiro médio ganha é destinado a pagar dívidas. Sem mencionar os endividados, claro, cujo salário inteiro é destinado a pagar contas.
Daí nos perguntamos, é falta de educação financeira?
Parte do problema, sim. Uma educação financeira plena gera conhecimento da teoria e ação mais inteligente para ajudar a controlar o dinheiro. No caso dos brasileiros, os dados de uma pesquisa do IBOPE e Serasa mostram que eles têm o conhecimento básico: o que lhes falta é colocar em prática.
Quais barreiras poderiam estar atrapalhando os brasileiros de se manterem saudáveis financeiramente?
1. O limiar da miséria
Aqui a palavra miséria significa sofrimento psicológico e não pobreza. Funciona mais ou menos assim:
Quando estamos passando por uma situação desagradável, seja falta de condicionamento físico, problemas amorosos ou mesmo dívidas financeiras, há um limite de dor que podemos suportar. Ao romper esse limite, simplesmente paramos de sentir dor; a situação para de nos incomodar. O problema é que, embora a situação não nos incomode mais, ela ainda existe. Então, a partir desse momento ela continua piorando, sem controle, pois sai de nossa supervisão.
Nesse cenário, é possível que você entenda os básicos da educação financeira mas pense que eles não servem para seu caso, que é muito grave. O que é uma bobagem: educação financeira é justamente mais útil para aqueles que precisam gerenciar grandes dívidas e sair do buraco. Contorne as desculpas e busque ajuda o quanto antes.
2. Campos cegos
É possível que as finanças tenham se tornado um de seus pontos cegos, como discuti quando falei sobre dívidas.
“Voltemos ao exemplo da pessoa com má condição física. Outro cenário possível – e mais comum do que você imagina – é a pessoa começar a dieta/tratamento, mas perceber que esse caminho requer um sacrifício muito grande. Assim, ela termina associando dor ao processo e à solução. Com o tempo, apenas ao pensar em “não comer chocolate” ou “frequentar academia”, essa pessoa sentirá dor.
Assim, como um mecanismo de autodefesa, o cérebro dela simplesmente ignorará o condicionamento físico, de modo a fugir da dor. Sempre que alguém falar com ela sobre isso, ela irá fugir do assunto; se ela ver algo na TV, ela mudará de canal. Haverá o surgimento de um verdadeiro ponto cego.”
Tudo isso pode acontecer com suas finanças. Por “sair do vermelho” ser um processo difícil, o surgimento do campo cego é algo possível. Faça uma reavaliação de como você se sente em relação à situação, como tem se comportado em direção a isso nos últimos tempos e obterá algumas respostas.
3. A esteira hedônica
Para ser mais exato, o fator três seria a categoria “coisas sobre a relação do dinheiro e da felicidade que as pessoas desconhecem”. O fenômeno da esteira hedônica é apenas um dos vários que você deveria conhecer se deseja ter uma boa saúde financeira.
Afinal de contas, educação financeira é mais do que entender o básico do que fazer com o dinheiro. Ela se trata de gerenciar seus recursos de modo a alcançar sua meta final, que provavelmente é felicidade pessoal e para quem você deseja. Se você não entende os princípios da relação do dinheiro e da felicidade, nenhum conhecimento sobre a gestão de riqueza vai trazer o que você deseja.
E sua saúde financeira sempre estará afetada, como a pessoa que usa um bom controle de gastos para juntar dinheiro e comprar um celular caro que, no final das contas, não vai fazê-la feliz. Ela não pode ser considerada “saudável” financeiramente já que não alcançou o que realmente queria, por não entender o processo.
Sobre a esteira hedônica per se, o princípio é simples: digamos que você consegue comprar um apartamento com uma vista belíssima para o mar. Você pode acordar, abrir a janela e ver a imensidão azul e uma bela praia. Isso fará você feliz, já que antes sua vista era simples, apenas um estacionamento cheio de carros.
No longo prazo, porém, ganhar a vista incrível para a praia simplesmente não vai trazer felicidade. Ao medir a felicidade dessas pessoas através de questionários constantemente, os resultados mostram que elas retornam ao nível anterior. Mesmo quando são casos extremos, como ganhadores de loteria, acontece o mesmo, como mostrou um famoso estudo em 1978.
Se você tem dinheiro, você vai e compra um helicóptero, para se sentir daquele jeito novamente. Depois de alguns dias, está de volta a escala anterior. E daí você compra um Iate, reiniciando o ciclo. É necessário cada vez mais esforço para manter o mesmo nível de felicidade, o que caracteriza a Esteira Hedônica como uma instância do efeito da Rainha Vermelha que já discutimos por aqui.
Sim, o que faço agora?
Os dois primeiros fatores podem estar impedindo que você ao menos se importe com sua saúde financeira. Investigar cuidadosamente suas ações e motivação nos últimos meses pode ajudar a entender se algum deles explica os problemas que você tem enfrentado. Ao identificar isso, você já está a meio caminho de tratar o problema.
Quanto ao terceiro fator, essa falta de conhecimento sobre a relação dinheiro-felicidade pode estar impedindo que você seja feliz, por fazer você gastar tempo com atitudes que não funcionam, por mais que a disciplina financeira esteja no lugar. A boa notícia é que, para corrigir esse cenário, a resposta é simples: é uma questão de ler e estudar mais a respeito.
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