Ninguém nasce pronto. Saber que você pode se tornar melhor em qualquer área que deseje é um fenômeno poderoso, porque te leva a perguntar como fazê-lo e a correr atrás.
Você ou está crescendo ou está morrendo (metaforicamente falando), diz o conhecimento popular, então é importante fazer um acompanhamento de onde você está em cada momento da vida: “há áreas que precisam de mais atenção do que outras? O que eu poderia estar fazendo para melhorar?”
Eu aprendi o poder de estudar a história em busca de lições para viver uma vida melhor. Isso veio com o efeito colateral de ajudar a entender o que é possível fazer uma vida inteira. A resposta é: muita coisa. Quanto mais biografias você ler, mais você enxerga o quanto somos capazes de fazer quando nos movemos na direção correta. Há muito potencial guardado em cada um de nós.
Na maior parte do tempo nem sentimos, mas posso apostar que você já se pegou pensando algum dia, sentindo-se um pouco inquieto, com um incômodo difícil de expressar com o estado de alguma das áreas de sua vida? Talvez incomodado com todas elas? Essa sensação é em parte um indicativo nosso para que prestemos atenção e possamos crescer e nos desenvolver naquela direção.
O que nós leva a pergunta “como fazer isso?”
A jornada de crescimento é um assunto que discutimos extensamente por aqui. O ponto sobre o qual quero falar hoje, no entanto, está um pouco mais adiante. É a pergunta que vem depois do “como fazer?”, que é “quais são os obstáculos para tanto?”.
Quais são os obstáculos a seu crescimento hoje?
Relendo o que considero o livro mais importante já escrito, cheguei a umas passagens que podem nos ajudar responder isso.
Um pouco de contexto: o nome da escola é Hogwarts, onde o herói Harry Potter estuda com sua amiga Hermione Granger e onde Dumbledore é diretor. Ao entrarem na escola os alunos são separados em “Casas”, que correspondem às características únicas de cada um, escolhidos pelo Chapéu Seletor. A casa da Grifinória é marcada por coragem e bravura, a casa Sonserina por ambição e astúcia, a casa Corvinal, inteligência e curiosidade e a casa Lufa-lufa, amizade e trabalho duro.
“Um Lufa-lufa diria”, disse Dumbledore, “que as pessoas falham a se tornarem quem elas estão destinadas a ser porque elas são preguiçosas demais para investirem todo o esforço envolvido. Um Corvinal […] repetiria essas palavras que um homem sábio sabe ser bem mais antigo do que Sócrates, conhece a ti mesmo, e diria que as pessoas falham em se tornar o que estão destinadas a ser por ignorância e falta de pensamento. E Salazar Sonserina […], bem, ele diria que nós nos tornamos quem estamos destinados a ser ao seguir nossos desejos onde quer que eles conduzam. Talvez ele diria que as pessoas falham em se tornarem o que são destinadas a ser porque elas se negam a fazer o que é necessário para alcançar suas ambições. […] Diga-me, Senhorita Granger, o que um Grifinória diria? Eu não preciso perguntar porque o Chapéu Seletor ofereceu a você aquela Casa.”
Não parecia uma pergunta difícil. “Um Grifinória diria que as pessoas não se tornam o que deveriam ser porque elas são medrosas”.
“A maioria das pessoas está com medo, Senhorita Granger,” disse o velho bruxo. “Elas vivem a vida inteira cercadas por um medo incapacitante que corta tudo que elas poderiam alcançar, tudo que poderiam se tornar. Medo de dizer ou fazer a coisa errada, medo de perder suas meras posses, medo da morte, e acima de tudo medo do que as outras pessoas pensarão delas. Tal medo é uma das coisas mais terríveis, Senhorita Granger, e é terrivelmente importante saber disso. Mas não é o que Godric Grifinória teria dito. As pessoas se tornam quem estão destinadas a ser, Senhorita Granger, por fazer o que é certo.”
Não é que a ideia de destino faça sentido; ela faz tanto sentido quanto a existência de fantasmas. O ponto aqui é que todo mundo é biologicamente único e vem de um meio mais ou menos único (posição social, composição familiar, etc.); dada essas condições, há uma pessoa em que você pode se tornar que é a melhor que você pode ser, dada “todas as condições iniciais do sistema”.
É para se tornar essa pessoa que estamos aqui, em busca de conhecimento para ser transformado em ação. Nesse contexto e com essa interpretação é que você deve interpretar as palavras do Dumbledore acima.
Mais na frente, conversando com Harry, Hermione pergunta o mesmo que lhe foi perguntado:
“Um…”, Harry disse, parecendo bem confuso e preocupado. “Eu acho que nós já somos nós mesmos… não é como se eu fosse uma cópia imperfeita de um outro alguém. Mas suponho que se eu tentar seguir o sentido de sua pergunta, então eu diria que as pessoas não se tornam si mesmas porque nós absorvemos todas essas maluquices do ambiente e então as regurgitamos.”
Se eu perguntasse a um especialista no estudo da mente humana, alguém bastante familiar com os erros e as falhas de nosso “equipamento”, se uma espécie alienígena fosse reconstruir algo como um ser humano do zero, que tipo de falha óbvia eles deixariam de fora, eu posso apostar que responderiam “a influência quase insana de nosso ambiente”.
É um pouco difícil passar a ideia de magnitude se você ainda não estudou um pouco da área (já que nosso cérebro é ruim de multiplicar em um nível intuitivo), mas a mente humana parece estar supersaturada de maneiras para ser influenciadas pelo meio que a cerca, muitas delas inconscientes.
Chega a um nível alarmante. Veja o priming, por exemplo. Priming é um fenômeno psicológico que consiste em estímulos recebidos em dado momento influenciarem os pensamentos e comportamentos mais tarde.
“Em um experimento recente, psicólogos em Yale alteraram a opinião das pessoas em relação a estranhos por darem a elas um copo de café.
Os participantes do estudo, estudantes universitários, não tinham ideia que seus instintos sociais estavam sendo manipulados deliberadamente. No caminho para o laboratório, eles se depararam com um assistente de laboratório, que estava segurando livros, uma prancheta, papéis e um copo de café quente ou frio – e pediu a eles para ajudá-lo com o copo.
Isso foi tudo que foi preciso: os estudantes que seguraram um copo de café gelado avaliaram uma pessoa hipotética sobre a qual eles leram mais tarde como sendo muito mais fria, menos social e mais egoísta do que seus amigos estudantes, que seguraram por alguns instantes um copo de café quente.”
Who’s Minding the Mind? por Benedict Carey
Um pequeno sinal em determinado momento, a temperatura do café, que não tinha nada a ver com a situação alterou seu julgamento, influenciando sua decisão mais tarde. Em outro estudo, para o qual não consegui achar um link agora, foi afirmado que os participantes do experimento, pessoas fazendo entrevistas de emprego que foram colocadas em uma sala de espera juntas, foram influenciadas pelo papel de parede do computador da sala. Quando o papel de parede continha notas de dinheiro, os participantes da entrevista eram menos amigáveis uns com os outros.
Se coisas tão simples e aleatórias quanto o café de alguém ou o papel de parede de um computador podem influenciar suas escolhas, imagine o que o conjunto de valores da sociedade em que você cresceu pode fazer com seu potencial? Ou como as crenças limitadoras de seus pais, de sua família, de seus amigos, pode limitar o que você deseja fazer?
No fundo, para a pergunta “por que as pessoas falham em se tornar quem estão destinadas a ser?”, eu gosto bastante de todas as respostas apresentadas acima, especialmente da resposta do Grifinória. Que seria a resposta dada por Sócrates, acredito: você se torna quem está destinado a ser ao fazer o que acha certo.
No entanto, seu próprio conceito do que é certo e errado é quase totalmente o conceito que você absorveu das pessoas que lhe cercam. Nosso código moral nunca é deliberado cuidadosamente e escolhido para refletir aquilo em que acreditamos; simplesmente absorvemos “essa maluquice” do meio em que crescemos e nunca pensamos se aquilo realmente faz sentido.
Por isso, para nos tornarmos aquilo que podemos ser, a resposta de Harry é aquela que mais se aproxima da verdade, é a que vai mais a fundo no problema.
“Estratégia é fazer as coisas por uma razão”
Para garantir que continuemos crescendo e nos desenvolvendo, é preciso tomar cuidado com nossas crenças e inclinações. Lá existe a maior parte da loucura do meio que absorvemos e frequentemente nem temos noção disso. O segredo se trata de garantir que podemos “rastrear” o motivo de fazermos A ou B a uma causa clara e que foi decidida por nós ou baseada em algo que acreditamos explicitamente.
Não se trata de se transformar num filósofo e questionar seu gosto por sorvetes de maçã verde toda vez que for comer. Nem de ignorar sua intuição completamente: afinal de contas, parte significativa de seu conhecimento é absorvida em redes neurais que não passam pelo nível cognitivo (gerando a intuição “educada”, especialmente depois de muito anos de estudo em uma determinada área), ou seja, que você não consegue pensar a respeito mas sabe a resposta.
É mais sobre se perguntar “O que eu quero para mim nessa situação e por quê?”. Por exemplo:
“Será que estabilidade é algo realmente importante, algo que valorizo mais do que, digamos, aventura? Ou constantes desafios? Esse medo “de perder o emprego amanhã” que faz as pessoas me aconselharem concurso público ao menos faz sentido? Quais são as opções? Vou sacrificá-las por causa do medo? Quem é maior?”
No final do dia, podemos resumir tudo isso a uma definição de estratégia que Sebastian Marshall deu certa vez: “estratégia é fazer as coisas por uma razão”.
Deliberar sobre o que você está fazendo, por que você está fazendo e o que você pretende alcançar. Assim é possível reduzir as crenças limitadores, chegar a um entendimento maior da realidade e destravar seu potencial.
Ótimo texto Paulo!
Estou vivendo um momento de mudanças em minha vida pessoal e profissional.
Mudei de estado e cidade e confesso que estou sentindo um medo que as vezes parece me dominar, apesar de confiar no meu potencial.
Ao mesmo tempo tenho um monte de projetos na cabeça que quero tocar pra frente, mas sinto uma dificuldade terrível!
Acabei de ler o seu ebook e achei excelente, 100% aplicável em meu momento atual!
Obrigado por compartilhar conteúdo tão relevante!
Boa, sentir medo é normal, o problema é deixar sua vida ser definida pelo medo.