Escolhi a Carreira Errada. E Agora?

Escolhi a Carreira Errada. E Agora?

Você percebe, mas não é do dia para noite.

Começa de modo pequeno, indireto. Falta de empolgação leva a problemas de produtividade. No começo, você culpa a procrastinação e vai atrás de conselhos para ser mais produtivo.

Depois de testar vários métodos e não obter resultado, você começa a ficar inquieto.

A rotina começa a incomodar.

Só então é que você desperta para a necessidade de mudanças. Mais especificamente, de mudança profissional. Seu trabalho não lhe completa mais.

E agora?

Já está difícil manter o emprego, o país em crise… como diabos vou sair daqui para ali?

Essa situação é muito mais comum do que você imagina.

Inclusive, você pode até pensar nela como o melhor cenário possível: você identificou claramente a necessidade de mudanças e sabe sobre o que agir.

Só não sabe exatamente como; nem por onde.

Mas pensa assim: isso já te coloca na frente de milhões de pessoas que nem isso notaram e se arrastam pelo mundo tentando preencher o vazio com aparências e hedonismo.

Você notou o problema e decidiu lutar. Esse é o primeiro e mais importante passo.

 

Antes de tudo, puxe o freio

Parada brusca

Já discutimos satisfação profissional por aqui.

Vale a pena frisar um efeito contrário a um ponto que discutimos por lá.

Quando “crescemos”, rapidamente deixamos o que acreditamos ser nossas paixões de lado para seguir caminhos que tragam dinheiro.

Afinal de contas, temos que pagar as contas.

De forma parecida, quando notamos que escolhemos errado, queremos decidir logo. E há várias razões para isso.

Primeiro, não é socialmente aceitávelnão saber o que fazer da vida”. Você olha para os lados e todos parecem ter certeza para onde estão indo.

Haverá bastante pressão da família e dos amigos sugerindo uma carreira tradicional. Talvez até a resposta padrão de estudar para concursos.

Outro motivo para nossa pressa em mudar de carreira é confundir a vontade de mudar com a certeza da escolha. Querer muito um trabalho diferente não significa que você quer muito essa primeira alternativa que veio à sua cabeça.

Novamente, caímos aqui no ponto da pressão social. Só é aceitável compartilhar uma mudança grande de rumo se (parece que) você sabe o que está fazendo.

É inaceitável tirar um tempo para explorar possibilidades. Ou perseguir projetos paralelos.

Toda essa pressão interna e externa leva ao conhecido “canguru profissional”: pessoas que saltitam entre várias opções sem se encontrarem de verdade.

Por isso, antes de tudo, eu tenho duas coisas a dizer:

1. Calma.
2. Sim, o que você quer fazer é possível.

 

3 fatores que explicam sua falta de direção profissional

Sem direção profissional

Antes de mudar de caminho, é preciso entender o que você fez de errado da primeira vez. É importante para entender sua história e não repetir os erros.

A lista abaixo está longe de ser completa, mas provavelmente cobre as causas mais comuns. A sua está no meio?

 

#1 Seguir o Script de Vida de Outra Pessoa

O diretor da sua vida

Alex Castro colocou isso muito, muito bem.

Um amigo, contando sobre suas escolhas profissionais:

Eu queria fazer Artes Cênicas, mas meu pai, que nunca me obrigou a nada, ficou insistindo pra eu fazer Direito, que Direito dava dinheiro, que Direito era mais seguro, que com Direito eu poderia fazer muitas coisas, e falou e falou, argumentou e insistiu, sem parar.

E o que você fez?, perguntei.

Cedi. Fiz Direito.

É uma tática, falei. Ele encheu seu saco e você, pra se livrar da chateação, cedeu e fez o que ele quis. Funcionou?

Bem, eu queria fazer penal, mas meu pai, que é super compreensivo e bem intencionado, ficou insistindo pra eu fazer Direito Tributário, porque Tributário é que dava dinheiro, porque Penal tem que ficar lidando com bandidos, que Tributário todas as empresas precisam, que ele tinha amigos nessa área, etc etc, falou e falou, argumentou e insistiu, sem parar.

E o que você fez?, perguntei.

“Cedi. Fiz Tributário.”

É uma tática, falei. Ele encheu seu saco e você, pra se livrar da chateação, cedeu e fez o que ele quis. Funcionou?

“Bem, eu queria trabalhar no Tributário de uma ONG, ajudar o mundo e coisa e tal, mas meu pai, que sempre só quer o meu bem e me ajuda muito, ficou insistindo para eu trabalhar no escritório do amigo dele, que era muito maior e mais sólido, onde eu teria um plano de carreira, onde eu prestaria serviços para as maiores e mais lucrativas multinacionais do mundo, etc etc, falou e falou, argumentou e insistiu, sem parar.”

E o que você fez?, perguntei.

Bem, aí eu rodei a baiana, né? Eu disse, porra, pai, já tenho 30 anos, sou formado em Direito, vou trabalhar onde eu quiser, caralho!

E aí? Ele te deserdou? Deu na sua cara? Cometeu suicídio de tanto desgosto?

Não. Ele falou, tá bem, meu filho, claro, é a sua vida.

Ficamos um pouquinho em silêncio e ele mesmo continuou:

E eu pensei: putz, se tivesse falado isso dois anos antes, teria feito Penal e não Tributário. Se tivesse falado isso cinco anos antes, teria feito teatro e não Direito. Se eu soubesse que podia dizer não, nunca teria terminado o namoro com a Paulinha, nunca teria me forçado a ir à igreja, nada disso.

E completou: “Minha vida toda teria sido outra. Bastava ter dito não.”

 

#2 Confundir interesses e carreiras

Skate e um homem que provou ser capaz

Esse fator provém do famoso conselho “faça o que você ama

Se você quer fazer o que ama, tem que buscar nos interesses atuais algo que possa te fazer dinheiro o suficiente, certo?

Errado.

Esse é, inclusive, um erro que eu cometi. Empolgado com o Gary Vaynerchuk, achei que bastava seguir meus interesses, um erro comum. Gary é bem intencionado e certamente fez funcionar para ele, mas não é simples como ele coloca.

Seres humanos são muito ruins para prever aquilo no que seremos bom e aquilo que iremos gostar com o tempo. Sem falar que a maior parte dos grandes interesses populares não possuem valor financeiro – ninguém vai te pagar para jogar videogame (sendo realista).

Por exemplo, você sabia que se vencer a barreira inicial, conforme evolui numa atividade, começa a gostar cada vez mais dela?

Novamente, não confundir a chegada (gostar do que faz) com o caminho (precisar fazer o que gosta).

 

#3 Pular de cabeça em tudo

Pulando de cabeça

Ah, estou na faculdade X, mas não estou gostando. Vou mudar para Y. Um ano depois, Y não é bem o que você esperava. Daí você vai para Z.

Daí em diante.

O que há de errado com essa atitude? Parece que há muita exploração, mas não passa de uma estratégia ruim de investimento.

Se você desconfia que pode se interessar por design, você não larga sua faculdade de direito para fazer design. Você entra na Empresa Jr. da faculdade e assume a responsabilidade pelas artes a serem criadas, mesmo sem saber nada a respeito.

Ou se voluntaria para melhorar o site de uma ONG que você admira. Ou se oferece para criar um, gratuito. Desse modo, se cria um contexto onde há necessidade de aprender o que você deseja, enquanto cria um trabalho concreto, no mundo real.

Aí sim será possível distinguir se design é para você ou não.

O melhor: a que custo? Praticamente zero. Só o seu tempo livre e sua disposição de aprender o tema novo, que já é existente, já que você quer mudar para aquela área.

Com essa estratégia leve, é possível experimentar uma gama muito maior de atividades e ainda adquirir habilidades que podem ser úteis mais na frente.

O que é muito melhor de que “apostar sua vida”, mudando bruscamente de rumo sem saber onde está pisando, jogando para trás toda sua bagagem, especialmente se não existe um modo para se sustentar no processo.

 

O que você pode aprender como um garçom?

Aprendendo como garçom

Imagine a seguinte situação.

Você está preso trabalhando como um garçom por que não conseguiu arranjar outro emprego e precisar pagar uma grande dívida que acumulou.

Serão dois anos perdidos da sua vida?

Você vai estar trabalhando em uma posição de baixa qualidade percebida, remunerada perto do mínimo, sem prestígio nenhum…

Algumas pessoas veriam isso como um inferno. Exatamente o oposto de tudo que foram ensinadas a valorizar.

Mas, olhando para além do óbvio, o que você pode aprender?

Bem, o garçom lida com pessoas o tempo inteiro. É o tipo de atividade que pode ajudar a pessoas mais introvertidas ficarem mais confortáveis em ambiente sociais.

O garçom também lida com vários tipos diferentes de pessoas. Com o tempo, aprende a ler um cliente, a descobrir quem vai dar dor de cabeça, quem é desagradável… se aprende a ler pessoas.

E ainda como efeito de lidar com muitas pessoas…. garçons podem conhecer muita gente, formando uma grande rede de contatos

Tudo isso não é simplesmente eu dizendo “seja otimista, olhe para o lado bom das coisas”. Não. Na verdade, eu sou mais realista que a média.

O que há de diferente nos contextos acima é a postura da pessoa passando pela atividade.

Em uma postura, a pessoa contrasta cada fator da situação com o cenário ideal e se lamenta por não estar lá.

Na segunda, ela utiliza o momento atual como um degrau em que vai aprender o máximo possível para usar como impulso para o próximo nível.

O Segredo da Mudança de Carreira

Mudança de Carreira

O que um peso de academia tem a ver com tudo isso?

Ele representa a ideia da Estratégia do Halter.

Um dos motivos pelo qual recomendo o livro Antifrágil, do Nassim Taleb, é que os achados dele (através de matemática rigorosa) se espalham para várias áreas de nossas vidas, desde bem-estar, até honra, investimento e educação de crianças.

Um dos desdobramentos da principal ideia do livro, a Antifragilidade, é a estratégia do halter.

É bem simples, como colocou o Alberto Brandão.


Taleb utiliza a noção de dois territórios imaginários para situar os leitores e facilitar a ambientação da ideia.

O Extremistão é o país onde grandes riscos são assumidos, partindo do entendimento que grandes resultados positivos só são possíveis em situações onde existem grandes – e frequentes – riscos.

O outro território é chamado de Mediocristão, onde os riscos são completamente evitados e, com isso, nenhuma grande recompensa pode ser encontrada.

A estratégia do Halter é um fruto típico do Extremistão, partindo do pressuposto que assumir grandes riscos podem gerar grandes benefícios, mas compreendendo que os possíveis danos não podem ser fatais, você precisa ser capaz de se recuperar após um trauma. Como num treino de academia, levantamos pesos a ponto de lesionar os músculos parcialmente, tornando-se mais forte como resultado da recuperação.

Grande parte do esforço de Taleb está em demonstrar como é difícil prever riscos e situações inesperadas (ele escreveu o livro A Lógica do Cisne Negro sobre isso).

Dentro desse contexto, o melhor a fazer é manter uma base pequena supersegura e colocar o resto exposto a riscos extremos.

Desse jeito, iremos nos beneficiar da volatilidade quando ela vier positiva (e ter ganhos de 300, 500, 1000%) e não morreremos caso venhamos a ser prejudicados pela volatilidade negativa.

O peso nos dois extremos é o oposto do que a maioria faz, quando se trata de investimentos.

O normal é procurar um investimento mediano em termos de risco, que termina pagando quantias irrisórias (não dá para prever claramente risco – se você quer esse nível de segurança, terá baixo retorno). Essa estratégia popular não expõe você a ganhos massivos, sendo bem ineficiente.

E como isso se conecta com a mudança de carreira?

Se você quer encontrar algo que realmente case com seu propósito e explore seus potenciais, não vai ser procurando no território mediano.

Nem indo apenas para os extremos.

Ser extremo sem a base leva à ruptura – por exemplo, você tem que estressar seus músculos na academia, mas não pode treinar levantando carros)

Sair pulando de carreira em carreira, investindo toda sua energia no palpite do momento sem ter a base estabelecida é ir para o extremo sem proteção.

Buscar apenas segurança e estabilidade é procurar o meio (pagamento alto com baixo risco, mas altíssima competição).

O ideal é aplicar o halter: ter uma reserva fixa, o dinheiro do “foda-se” (uma reserva de 3~6 meses), e experimentar em paralelo com várias projetos de curta duração e bom potencial, para que você possa transicionar sua vida assim que encontrar a oportunidade adequada.

O lado bom é que todo esse processo hoje leva muito menos tempo do que há alguns anos. A democratização das ferramentas de produção, o livre acesso à informação e o advento da internet permite que conquistemos essa transformação de curto a médio prazo (antes podia levar até décadas).

Essa estratégia é boa, inclusive, para quem está começando agora. Ela apenas requer que você acesse informação de alta qualidade para entender o que está acontecendo e começar a experimentação com guias como esse e esse.

E então, vamos colocar a mão na massa?

 

  1. Excelente post!

    Justamente em um momento em que penso investir em novas áreas de minha carreira e até mesmo em empreender no mundo digital!

    Parabéns Paulo Ribeiro por abordar um tema tão complexo de forma bastante simplificada!

  2. Muito bom, paulo! O engraçado é que este texto apareceu justamente num momento onde pretendo mudar de carreira. As coisas nao sao por acaso. Abç, Deus abençoe!

  3. Ótimo artigo, como sempre! estou cada vez mais admirando seu trabalho

    Estou buscando essa “mudança de carreira” e por isso toda informação é bem vinda,

    Baseado no seu artigo “sucesso-sem-diplomas-michael-ellsberg”, estou começando essa mudança, estou na primeira fase e buscando clientes parceiros para aplicar meu conhecimento, e esse artigo também vai me ajudar muito!

    Fiquei com uma dúvida nessa parte “Empolgado com o Gary Vaynerchuk, achei que bastava seguir meus interesses, um erro comum. Gary é bem intencionado e certamente fez funcionar para ele, mas não é simples como ele coloca.”

    Seria errado seguir meus interesses? pois é justamente isso que estou fazendo..via alguns videos do Gary Vaynerchuk por sua recomendação e achei eles ótimos!

    Agradeço pelo ótimo artigo e estou ansioso pela resposta!

    1. Expandindo um pouco no meu comentário sobre Gary:

      Sim, o ideal é você ir atrás do que lhe interessa como endgame, mas para chegar lá, raramente o caminho mais eficiente vai ter você fazendo essa atividade que ama desde o começo.

      Por exemplo, digamos que você goste muito de desenhar e queira criar as próprias tirinhas. Isso significa que você vai largar o emprego agora e começar a desenhar de casa?

      Não. É preciso primeiro acumular muitas habilidades além do seu interesse: o lado técnico de criar um site, como se posicionar no mercado e especialmente como criar uma audiência.

      Sò depois de você chegar um nível considerável, será possível fazer apenas aquilo. E é totalmente possível, com pessoas como o Oatmeal vivendo confortavelmente de um trabalho que ama.

      Na mensagem do Gary, não fica claro que você tem que tomar esse caminho mais longo. As pessoas, ao ouvirem ele falar, assumem logo o primeiro modo – que não funciona.

      Clareou?
      Abraços

      PS: O primeiro passo daquele Guia é demonstrar seu domínio da área de interesse de modo indireto (conseguindo autoridade através de um portal, por exemplo). Sem essa demonstração mínima de competência, é difícil conseguir os primeiros projetos.

  4. Olá, Paulo!

    “Ah, estou na faculdade X, mas não estou gostando. Vou mudar para Y. Um ano depois, Y não é bem oque você esperava. Daí você vai para Z”.

    Estou vivendo isso na minha vida, atualmente. Estou na metade do curso de administração, mas penso em mudar para psicologia ou jornalismo. O problema, no meu caso, é que não sei o que de fato gostaria de fazer, a paixão, para então chegar nela. Você por acaso tem alguma recomendação neste caso?

  5. Muito bom!

    Paulo Ribeiro, estou com 45 anos, há 20 sou engenheiro. Com a crise houve uma estagnação no mercado, me obrigando a fazer o que nunca havia feito: dar um tempo. Justamente, observando o lado positivo, comecei a me interessas por outras atividades. Você acha que o avanço da idade é um fator que inviabiliza essas mudanças?

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