La Rochefoucauld com Reflexões Sobre Amor, Gratidão e Felicidade

La Rochefoucauld com Reflexões Sobre Amor, Gratidão e Felicidade

Antes de mais nada, uma breve introdução. Afinal de contas, quem é Rochefoucauld? Por que se importar com o que ele fala?

François de La Rochefoucauld foi um … bem, você não pode chamá-lo de filósofo no sentido tradicional da palavra, mas talvez.. um grande observador da natureza humana. Ele refletiu sobre os motivos e as condutas dos homens, estando muito bem posicionado como um francês nobre do século XVII para observar o pior das intrigas na Corte.

Em seu livro, Reflexões ou Sentenças e Máximas Morais, no qual trata da natureza humana em ação, por assim dizer, há um trabalho feito com um olhar preciso e sem rodeios. Ele não receia ao descrever claramente as atitudes humanas que observa, tal qual Robert Greene o faz hoje em dia.

Já na introdução do curto livro, ele aconselha o leitor a “colocar em sua mente desde o começo que nenhuma dessas máximas se aplicam a ele (o leitor) em particular, e que ele é a única exceção, muito embora elas pareçam ser generalidades”.

Depois disso, Rochefoucauld  continua, “eu garanto que ele será o primeiro a endorsá-las e ele acreditará que elas fazem crédito ao espírito humano”.

Para um leitor mediano, pode parecer estranho ter um livro composto basicamente de 504 passagens curtas; parece mais uma “coleção de frases para facebook” ou algo do gênero. Mas já vimos como pode ser perigoso deixar o cérebro completar os padrões antes de pensar ativamente a respeito.

A melhor maneira seria encará-las como “comidas para o cérebro”; pequenos pedaços de conhecimento sobre os quais você pode refletir. Alguns deles possuem desdobramentos significativos na forma como você age e no modo como você observa as pessoas a sua volta.

Tendo em mente que é um livro curto, acessível, sobre a natureza humana enxergada através das lentes de alguém enxergando a vida na Corte (e todas as maquinações por trás), e escrito por alguém que veio a influenciar grandes mentes como Nietzsche, Voltaire, Proust, de Gaulle e Conan Doyle, o custo de você não lê-lo é muito alto.

Algumas passagens favoritas –

Os homens não só estão sujeitos a perder a lembrança dos benefícios e das injúrias, como até odeiam os que os obsequiaram e deixam de odiar os que os ultrajaram. O zelo em recompensar o bem, e vingar-se do mal, parece-lhes uma servidão a que lhes custa se submeter.

Isso se conecta com uma passagem mais na frente em que diz :”O que cria a desilusão no reconhecimento que se espera dos favores que fizemos é que o orgulho de quem dá e o orgulho de quem recebe não conseguem se acertar sobre o preço do benefício.”

Deveras interessante e uma lição que carrego perto, já que um erro nessa área me custou bastante há alguns meses, muito embora eu tivesse lido a respeito dessa desconsideração o ser humano em geral tenha sobre gratidão. Como já vimos por aqui ao estudar as leis do poder:

Gratidão é uma coisa linda quando expressada, mas não é algo com a qual você deve contar. Nunca espere algo em retorno, óbvio, mas nem conte com “karma positivo” ou que a pessoa vai ter “consideração” com você porque você foi considerativa com ela.

O que você precisa entender é como o conceito de gratidão é frágil. O outro está retribuindo algo feito por você que o beneficiou, um sentimento que só existe de acordo com a ótica de mundo dele. Você nunca deve “contar com a gratidão na barriga da galinha”, pois é bem provável que do ponto de vista dele, você não o tenha beneficiado tanto quanto acha que beneficiou, livrando-o da obrigação de ser grato. Como as pessoas escolhem acreditar no que é mais cômodo…

Felicidade, claro, não poderia ficar fora do prato.

Nunca somos tão felizes nem tão infelizes quanto imaginamos

Nem o amor. Até hoje, essa é definição mais útil que já encontrei e, embora esteja escrita em prosa, é quase poética.

É difícil definir o amor. O que se pode dizer é que na alma é paixão de reinar, nos espíritos é simpatia, e no corpo é apenas o desejo oculto e delicado de possuir o que se ama depois de muitos mistérios.

Quando se trata de filosofia, você já sabe como admiro os estoicos. Um dos vários motivos para isso é que pregavam a vida simples e frugal, enquanto os principais ícones da “escola” eram extremamente poderosos. Uma coisa é pregar viver na pobreza se você nunca teve chance de conhecer o que é ser rico; outra coisa é ser o homem mais poderoso do mundo, como Marco Aurélio foi, ou o mais rico de Roma, como Sêneca foi, e ainda assim recomenda e praticar a frugalidade.

O desprezo pelas riquezas era para os filósofos um desejo oculto de vingar seu mérito diante da injustiça do destino pelo desprezo dos próprios bens de que os privara; era um segredo para se garantirem contra o aviltamento da pobreza; era um caminho tortuoso para chegarem à consideração que não podiam obter pelas riquezas.

O que se relaciona, de modo tangente, a outro ponto.

Ninguém merece ser elogiado por sua bondade se não tem a força para ser mau: qualquer outra bondade não é mais preguiça ou impotência da vontade.

Quem você acha que deveria receber mais honras por ser uma pessoa íntegra: um oficial do governo que trabalha no campo de comunicações com a imprensa ou um inspetor da Receita Federal?

La Rochefoucauld toca em um ponto importante: se você vive uma vida em que as tentações de fazer algo errado (força para ser mau) não chegam a você, bem, não há nem de perto tanto mérito quanto na vida de alguém exposto constantemente a tentações que ainda assim mantém a integridade.

A minha favorita passagem favorita é:

Prometemos segundo nossas esperanças e cumprimos segundos nossos temores.

É impressionante o quanto Rochefoucauld consegue empacotar em simples frases. Se ficou interessado, pegue uma cópia do Reflexões ou Sentenças e Máximas Morais para sua mesa de cabeceira.

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